quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Felicidade




É certo! Todos buscam uma forma de ser feliz, de se encontrar sem sofrimento, dor ou perda... Eu não paro de pensar nisso! Hoje foi o Sarau de Natal na Embaixada de Portugal e uma certa poesia não me deixa em paz! É como se me chamasse a todo momento a ver que eu posso estar morrendo nas miserabilidades impostas e não conseguisse mais respirar, só o grito desesperado de quem sabe o que é a prisão poderia entender o que às vezes passa aqui dentro!

Sim, faço muitas coisas que uma pessoa normal não faria, portanto, o que vem a ser normal? É, existem momentos em que adoro ficar sozinha, sair sozinha, só observar as pessoas e o que acontece a minha volta... sim, eu não me dou pra quem é simplesmente normal, eu não gosto dessa idéia e não aceito esse conceito, não sou como a maioria e não aceito definições! A vida não é feita de limitações e quando só nos obrigamos a fazer e não sentir, nos tornamos bonecos, fantoches da alma e vontade humana.

Gosto da poesia, do jeito que ela me conquista, da música e do jeito que ela me consola e gosto de saber que existe amor, mesmo quando duvido que ele exista... E quanto a vida, estamos aqui de passagem, basta viver e não simplesmente conceder!

E quem não achar que essa poesia é a forma mais pura e perfeita de amor, precisa urgente de um coração!



O noivado no Sepulcro

(Soares de Passos)


Vai alta a lua! na mansão da morte

Já meia-noite com vagar soouu;

Que paz tranqüila; dos vaivéns da sorte

Só tem descanso quem ali baixou.

Que paz tranqüila!... mas eis longe, ao longe

Funérea campa com fragor rangeu;

Branco fantasma semelhante a um monge,

Dentre os sepulcros a cabeça ergueu.

Ergueu-se, ergueu-se!... na amplidão celeste

Campeia a lua com sinistra luz;

O vento geme no feral cipreste,

O mocho pia na mormórea cruz.

Ergueu-se, ergueu-se!... com sombrio espanto

Olhou em roda... não achou ninguém...

Por entre as campas, arrastando o manto,

Com lentos passos caminhou além.

Chegando perto duma cruz alçada,

Que entre os ciprestes alvejava ao fim,

Parou, sentou-se com a voz magoada

Os ecos tristes acordou assim:

"Mulher formosa, que adorei na vida,

E que na tumba não cessei de amar,

Por que atraiçoas, desleal, mentida,

O amor eterno que te ouvi jurar?

Amor! engano que na campa finda,

Que a morte despe da ilusão falaz:

Quem dentre os vivos se lembrara ainda

Do pobre morto que na terra jaz?

Abandonado neste chão repousa

Há já três dias, e não vens aqui...

Ai, quão pesada me tem sido a lousa

Sobre este peito que bateu por ti!

Ai qão pesada me tem sido!"e em meio

A fronte exausta lhe pendeu na mão,

E entre soluços arrancou do seio

Fundo suspiro de cruel paixão.

"Talvez que rindo dos prostestos nossos,

Gozes com outro d'infernal prazer;

E o olvido cobrirá meus ossos

Na fria terra sem vingança ter!

"Ó nunca, nunca!" de saudade infinita,

Responde um eco suspirando além...

- "Ó nunca, nunca!" repetiu ainda

Formosa virgem que em seus braços tem.

Cobrem-lhe as formas divinais, airosas.

Longas roupagens de nevado cor;

Singela c'roa de virgíneas rosas

Lhe cerca a fronte dum mortal palor.

"Não, não perdeste meu amor jurado:

Vês este peito? reina a morte aqui...

É já sem forças, ai de mim, gelado,

Mas ainda pulsa com amor por ti.

Feliz que pude acompanhar-te ao fundo

Da sepultura, sucumbindo à dor:

Deixei a vida... que importava o mundo,

O mundo em trevas sem a luz do amor?

Saudosa ao longe vês no céu a lua?"

- "Ó vejo sim... recordação fatal"-

Foi à luz dela que jurei ser tua

Durante a vida, e na mansão final.

Ó vem! se nunca te cingi ao peito,

Hoje o sepulcro nos reúne enfim...

Quero o repouso do teu frio leito,

Quero-te unido para sempre a mim!

"E ao som dos pios do cantor funéreo,

E à luz da lua de sinistro alvor,

Junto ao cruzeiro, sepulcral mistério

Foi celebrado, d'infeliz amor.

Quando risonho despontava o dia,

Já desse drama nada havia então,

Mais que uma tumba funeral vazia,

Quebrada a lousa por ignota mão.

Porém mais tarde, quando foi volvido

Das sepulturas o gelado pó,

Dois esqueletos, um ao outro unido,

Foram achados num sepulcro só.

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